Em janeiro de 2018, a Comissão de Valores Mobiliários aprova a primeira plataforma de equity crowdfunding: EqSeed. Tal empresa operará segunda a Instrução CVM n° 588, de 13 de julho de 2017.

Todavia, aquele que investir por este meio não precisará se incomodar com o Imposto de Renda do exercício 2017, que se encerra em 28/04/2018. Mas sim, apenas, no ano de 2019 que os ganhos passarão a figurar na Declaração (DIRPF).
Quanto aos aspectos conceituais, no artigo 2° da Instrução, são as definições traçadas:

I – crowdfunding de investimento: captação de recursos por meio de oferta pública de distribuição de valores mobiliários dispensada de registro, realizada por emissores considerados sociedades empresárias de pequeno porte nos termos desta Instrução, e distribuída exclusivamente por meio de plataforma eletrônica de investimento participativo, sendo os destinatários da oferta uma pluralidade de investidores que fornecem financiamento nos limites previstos nesta Instrução;
II – plataforma eletrônica de investimento participativo (“plataforma”): pessoa jurídica regularmente constituída no Brasil e registrada na CVM com autorização para exercer profissionalmente a atividade de distribuição de ofertas públicas de valores mobiliários de emissão de sociedades empresárias de pequeno porte, realizadas com dispensa de registro conforme esta Instrução, exclusivamente por meio de página na rede mundial de computadores, programa, aplicativo ou meio eletrônico que forneça um ambiente virtual de encontro entre investidores e emissores;
III – sociedade empresária de pequeno porte: sociedade empresária constituída no Brasil e registrada no registro público competente, com receita bruta anual de até R$ 10.000.000,00 (dez milhões de reais) apurada no exercício social encerrado no ano anterior à oferta e que não seja registrada como emissor de valores mobiliários na CVM;
IV – renda bruta anual: soma dos rendimentos recebidos pelo investidor durante o ano-calendário e constantes da sua declaração de ajuste anual do imposto de renda, incluindo os rendimentos tributáveis, isentos e não tributáveis, tributáveis exclusivamente na fonte ou sujeitos à tributação definitiva;
V – sindicato de investimento participativo (“sindicato”): grupo de investidores vinculados a um investidor líder (“investidores apoiadores”) e reunido com a finalidade de realizar investimentos em sociedades empresárias de pequeno porte, sendo facultativa a constituição de um veículo de investimento para participar das ofertas públicas de distribuição de valores mobiliários realizadas com dispensa de registro nos termos desta Instrução; e
VI – investidor líder: pessoa natural ou jurídica com comprovada experiência de investimento nos termos do art. 35, § 2º e autorizada a liderar sindicato de investimento participativo.

Para oficializar o investimento existem três (3) formas contratuais possíveis: Contrato de Investimento em Nota Conversível; Contrato de Participação para Investimento-Anjo; e Contrato de Mútuo Conversível.
A quarta via seria um Contrato de Parceria, em que as pessoas envolvidas dão início a um empreendimento (parceria) com um objetivo específico (aumentar o valor da empresa, sua abrangência territorial, etc.) e prevendo a forma como os lucros serão divididos entre os contratantes. Porém, não há a distinção clara entre o investidor e o empresário que inicia a sua StartUp, aqui ambos têm o mesmo tratamento frente aos objetivos estabelecidos em contrato, algo que não se verifica na realidade (afinal, um só disponibiliza o numerário e outro viabiliza a atividade da empresa).

Porém, o que são os demais contratos, aquelas três (3) alternativas que realmente traçam uma linha divisória entre o investidor e a empresa investida?

Contrato de Investimento em Nota Conversível e Contrato de Mútuo Conversível nada mais são que o estabelecimento de uma injeção de recursos da parte de um investidor em uma empresa, cuja comprovação reside na oficialização de um mútuo no próprio contrato firmado ou pela emissão de papéis (títulos de dívida conversíveis em participação societária/convertible notes) da investida em favor do investidor.

O Contrato de Investimento em Nota Conversível se bem ajustado, valendo-se apenas de mecanismos legais já existentes e consolidados, resguarda investidor e empresa investida, haja a vista que estabelece a forma de conversão do dinheiro injetado em cotas da sociedade por meio de uma representação explícita do direito existente e da expectativa futura (por meio das convertible notes). Todavia, este modelo com os referidos papéis, por oficiar diretamente no fluxo de caixa, opera melhor para empresas tributadas pelo lucro real. Pois com a operação de investimento, a empresa não contabiliza como capital social, mas sim como empréstimo, logo, não integra o patrimônio tributável. Tal incremento só se dará no momento da conversão da StartUp em S/A.

Já na esfera do patrimônio do investidor, ele declara um contrato de mútuo na aba “bens e direitos” com a “discriminação” de ser nota conversível e situação em 31/12 o valor devido a ele. Se dissolvida a sociedade antes da conversão, no exercício que ocorreu, ele zera o mútuo (situação 31/12) e discrimina a liquidação, indo o valor correspondente para a conta corrente indicada. Caso haja sucesso e a empresa se converta em S/A, ele zera o mútuo e abre novo item na aba “bens e direitos” dizendo que as cotas/ações resultantes do mútuo restaram convertidas em percentual da empresa com direta correspondência ao o valor da operação de mútuo. Assim, fica resguardada a base de cálculo para o ganho de capital caso o investidor queira vender futuramente tais ações.

Observação, em S/A aberta o registro é da bolsa que realiza o IRRF ao realizar o DBE. Se S/A fechada o registro fica no livro de transferência, não tem DBE, basta informação na DIRPJ e DIRPF das pessoas envolvidas com a conversão, lançando retenção pela PJ no momento de acréscimo de percentual de algum sócio.

A Anjos do Brasil, entidade de fomento ao investimento anjo e empreendedorismo no Brasil, disponibiliza cartilhas e modelos de contratos. Na versão deles para o Mútuo Conversível existe o estabelecimento de um cronograma de desembolso e faz clara referência de que a empresa investida se trata de limitada (dada a obrigação de informar a Junta Comercial). Este modelo é mais interessante se a pessoa jurídica – PJ tributada (StartUp) for uma que tenha seu regime de apuração o lucro presumido, bem como não haja a mínima intenção de se tornar S/A.

Em razão do cronograma de desembolso, obriga-se a PJ e o mutuante a ficar atualizando a parte da aba “bens e direitos” quanto a situação em “31/12”, inclusive porque já no momento do desembolso pode realizar a opção de conversão. Ademais, o modelo desta entidade, pelo fato de se tratar de empresa limitada, as partes contratantes devem relevar nas suas estimativas as taxas da Junta para registro das alterações societárias e obrigação acessória de fornecer DBE para Receita. Com isto, o período de apuração contará para o cálculo do IRPJ pelo acréscimo patrimonial (aumento do capital social) e IRRF sobre o valor da cota adquirida (acréscimo patrimonial do investidor).

Por fim, a alternativa representada pelo Contrato de Participação para Investimento-Anjo. Isso foi viabilizado por alteração legislativa, publicação da Lei n° 155 de 2016, que mudou dispositivos da Lei do Simples Nacional (Lei n° 123, de 14 de dezembro de 2006). Com isso, a realidade brasileira ganhou um meio menos custoso para empresa incluída no Simples receber capital de investidor que não queira se tornar sócio. Logo, o que definia as opções anteriores era que o investidor poderia vir a participar na empresa, a presente não oferece tal possibilidade.

A operação de investimento nos moldes da LC123/06 explicitamente não é receita (para afastar IRPJ), é aporte de capital, mas que só opera na empresa por um lapso de tempo, o que faz com que não integre o capital social. Ela contabiliza como empréstimo.

A pessoa do investidor por sua vez tem remuneração por período (art. 61-A, §4°, III, e §6° da legislação mencionada). Como ele não integra a sociedade não receberá por dividendos (que não incide IRPF), mas por JSCP (juros sobre capital próprio, pois ele é tratado pela empresa como resultado na despesa) e incide IRPF para o investidor. Após 2 anos já pode ocorrer o resgate e como o art. 61-A §7° afirma que este não pode ser superior ao valor investido corrigido, procede-se como o apontado quanto a aba “bens e direitos” na DIRPF, porque se excedesse os parâmetros legais 1) descaracterizaria o investimento anjo e 2) daria margem à tributação por ganho de capital.

Mais uma vez, a conversão do investimento em cotas não é a intenção da legislação para o investidor anjo. Entretanto, em alguns contratos de investidores-anjo pode vir a existir essa previsão, portanto, caso exista tem de seguir a ritualística normal para o formato da empresa, seja limitada ou anônima.

Se sociedade limitada tem de passar pela burocracia da Junta Comercial, além de a empresa fornecer DBE para a Receita, com a efetivação dos devidos recolhimento (IRPJ sobre o acréscimo patrimonial da empresa e IRRF no momento do acréscimo patrimonial do acionista com as cotas). Por fim, a entrada do investidor como sócio tem de atentar para as regras do Simples, pois pode custar a exclusão do programa (se investidor PJ ou pessoa que tenha outra empresa que somada a investida ultrapasse R$ 360.000,00 para micro e R$ 4.800.000,00 para pequeno porte).

Tais modelos são boas ferramentas de pesquisa e pontos de partida, mas para que exista uma maior segurança jurídica tanto para a StartUp como para o investidor nada melhor que buscar contratos tailor made, na justa medida para a necessidade existente, e isso só é possível com a assessoria de advogado experiente.

  • Artigo elaborado por João Antonio Ferreira Gusi, advogado especialista em Direito Tributário Empresarial e Processo Tributário.
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